A política antigênero, vinculada aos ataques à liberdade de pensamento e expressão no ambiente educacional e acadêmico que, desde alguns anos, é traço forte da restauração do conservadorismo e autoritarismo no Brasil, assumiu novas proporções no processo eleitoral de 2018 e seus desdobramentos. Embora não seja possível oferecer um mapa preciso de tudo que aconteceu desde setembro nesse âmbito, já conflagrado desde algum tempo, nosso radar captou os seguintes fatos.
Na semana anterior ao segundo turno, diversas forças policiais e agentes da Justiça Eleitoral realizaram batidas e apreensões em dezessete universidades públicas em nove estados para suspender demonstrações anti-fascistas depois de serem denunciadas por grupos pró-Bolsonaro, em particular o MBL. Em decisão do STF, as ordens de 11 juízes foram consideradas inconstitucionais e então suspendidas. Também no espaço da universidade, demonstrações fascistas ecoaram após o resultado das urnas, quando uma foto de alunos da FEA-USP circulou, mostrando quatro alunos homens vestidos de personagens autoritários, portando armas e segurando mensagem ameaçadoras direcionada às mulheres. As ameaças, no entanto, são parte de um arsenal mais amplo e direcionadas principalmente aos pesquisadores de gênero e sexualidade no ambiente universitário, como nos relatou o professor da UFPE Gustavo Gomes da Costa, ameaçado diretamente, assim como seus orientandos.
Em relação às escolas secundárias, em mais uma tentativa de véspera, deputados da bancada evangélica e pró-Bolsonaro redigiram uma versão ainda mais restritiva do Escola Sem Partido (PL 7180/2014) para ser votada em sessão fechada na terça-feira seguinte ao resultado da eleição, no dia 31 de outubro. A sessão, após pressão da sociedade civil, conseguiu ser adiada, mas o relator do projeto afirmou que esse tema foi um amplamente apoiado nas ruas e confirmado pela vitória do candidato Bolsonaro. O projeto voltou a ser posto em pauta nessa semana, mas novamente foi adiado para terça-feira (13). Nesse sentido, uma nova Sugestão Legislativa foi proposta para criminalizar a “ideologia de gênero” e já conta com o apoio de mais de 308 mil pessoas. Em seguida, por uma proposição da recém-eleita deputada estadual Ana Caroline Campagnolo (PSL), que esteve no 1º Congresso Anti-Feminista, um canal de denúncia foi criado contra professores que se expressassem contra o presidente eleito. O canal foi rapidamente considerado ilegal pelo Ministério Público de Santa Catarina. No entanto, na terça-feira, dia 6 de novembro, um aluno do Colégio Pedro II no Rio de Janeiro filmou o seu professor. Ainda mais temível é a decisão ainda a se confirmar sobre o futuro do Ministério da Educação. Dois nomes tem sido apontados, o General Aléssio Ribeiro Souto e Stavros Xanthopoylos, que concordam com a política anti-gênero na Educação, assim como outras medidas extremamente conservadoras para o currículo escolar. E, numa grave denúncia publicada pelo Correio Braziliense, Bolsonaro quer influenciar na composição das listas de nomes de reitores universitários.
Ações policiais contra “propaganda irregular” geram tensão em universidades – DN
Cármen Lúcia suspende medidas que determinaram ações policiais em universidades – Estadão
USP investiga alunos que posaram para foto com mensagens de ódio a petistas – Uol
Análise: Projeto Escola Sem Partido ganha versão ainda mais restritiva – O Globo
Sugestão Legislativa 24/2018 “Tornar crime o ensino de “ideologia de gênero” nas escolas” – Senado
Deputada aliada do Bolsonaro cria canal anônimo de denúncia contra professores – Estadão
MP pede que deputada que criou canal de denúncias contra professores pague indenização – Estadão
Aluno do Pedro II filma aula e ouve resposta de professor – O Globo
Equipe de Bolsonaro mapeia universidades para tentar influir na escolha de reitores – Correio Braziliense