A série fotográfica “Onde o amor é ilegal”, de Robin Hammond, atualmente em exibição no Bronx Documentary Center, é desconfortavelmente bonita. Nela, os sujeitos posamcomo eles gostariam de ser vistos. “D.” e “O.”, da Rússia, se abraçam. Darya, também da Rússia, tem o peito nu, mas ela está cobrindo os seios com uma mão e segurando uma faca na outra, como se estivesse pronta para se defender. Simon, de Uganda, aparece com o tronco nu, mas a cabeça coberta por um pano verde. Suas cicatrizes são visíveis; as das mulheres não são. Todos os quatro descrevem as maneiras pelas quais e como foram agredidos, assim como a maioria dos outros suejitos retratados nas fotos. A exposição é baseada no projeto on-line em andamento de Hammond que documenta, como seu site descreve, “histórias LGBTI de discriminação e sobrevivência em todo o mundo”.
Hammond começou a série “Onde o amor é ilegal” em 2015, através de sua organização sem fins lucrativos Witness Change. Muitas das pessoas que compartilham suas imagens e histórias vêm de países onde relações sexuais entre entre pessoas LGBTTI+ são criminalizadas; outros têm sido alvo de ódio em lugares onde a homossexualidade não é criminalizada. Alguns participantes enviam selfies. Alguns não publicam fotos. Alguns apresentam fotografias de entes queridos que perderam. Em uma fotografia de Camarões, uma mulher chamada Alice está segurando uma foto de seu irmão mais novo, Eric, que foi torturado e morto em 2013, por se manifestar contra discriminação sexual. Após a sua morte, a família continuou recebendo ameaças. Uma mensagem de texto dizia: “Você vai morrer como seu viado”.
Talvez a fotografia mais marcante do projeto não faça parte da exposição atual. Não foi tirada por Hammond, nem por qualquer outro fotógrafo profissional – tem o ângulo estranho e o sorriso torto de uma selfie. O nome do homem na foto é Faried e seu rosto está coberto de sangue. Parece que ele tem vinte e poucos anos. A narrativa em primeira pessoa que o acompanha explica que Faried chamou a atenção do público em seu país natal, o Egito, quando publicou um post no Facebook para celebrar a sobrevivência de sua rodada final de quimioterapia. Dezenas de milhares viram sua página, onde ele escreveu abertamente sobre ser gay. Depois disso, ele foi ameaçado, perseguido, espancado, ameaçado e perseguido novamente. Ele finalmente saiu do Egito. As ameaças não pararam. “Estou no Líbano agora”, escreve Faried. “Eu não me sinto a salvo, eu não sei por quanto tempo eu ainda vou resistir.” Ele está sorrindo na foto porque ele sobreviveu ao câncer, à discriminação sexual e ao exílio – até agora – ou simplesmente porque, quando alguém tira uma selfie, sorri? As fotos de Hammond são tão bonitas porque elas celebram o espírito humano, a vontade de ser e amar, sejam quais forem as circunstâncias e as leis? Ou porque ele e seus súditos querem que a imagem pareça marcante em um quadro? Eu não sei, mas a disjunção entre as imagens e as histórias por trás delas é o que faz com que “Onde o amor é ilegal” seja tão impressionante.
*Este artigo foi originalmente escrito por Masha Gessen e publicado na revista The New Yorker em inglês no dia 10 de fevereiro de 2019.